Problemas Neorreacionários

Estou sob a sagrada obrigação de analisar o e-book What is Neoreaction? Ideology, Social-Historical Evolution, and the Phenomena of Civilization de Bryce Laliberte. Felizmente, este solene dever não foi especificamente agendado. Trabalhar para a sua realização é um processo instigante, o que é uma coisa boa.

Por uma questão trivial, sou forçado a perguntar: Deveria ser ‘fenômenos’ mesmo? ‘Fenômeno’ seria mais estilisticamente persuasivo, mesmo que o plural seja defensável por razões conceituais. Esse tipo de questão secundária, contudo, é auto-distração sintomática. Há questões sérias em jogo aqui, e elusivas.

Minha prevaricação é, parcialmente, o resultado de ideias que colidem, que ficaram emaranhadas ao significado desse livro (para mim), mas não são realmente internas às suas próprias preocupações. A primeira entre estas é a conotação da própria palavra ‘neorreação’, que acende uma conversação embriônica (na casa de Laliberte e na minha). Questões terminológicas podem facilmente parecer impertinentes ou fetichistas, mas, neste caso pelo menos, elas se estendem continuamente para dentro de questões de indisputável substância e relevância. Sumariamente: A ‘neorreação’ é primariamente uma doutrina ou um problema? (Talvez o ponto de interrogação injustamente enviese o julgamento.)

Em um post futuro, eu voltarei às especificidades da definição estendida de Laliberte – que é, sem dúvida, coextensiva ao livro. É de amplo interesse e se conecta de maneira importante com a busca de Nick B. Steves por ‘consenso reacionário‘ (note: sem ‘neo-‘). Neste ponto, contudo, minhas observações marcadoras de lugar são, elas mesmas, deliberadamente problemáticas, referindo-se ao papel do paradoxo e da ironia no termo e na ‘coisa’ – elementos que são, para mim, essenciais, mas que eu suspeito que Laliberte veja como incidentais ou mesmo lamentáveis. A neorreação, da perspectiva problemática, é a insistência de uma questão, em vez de uma solução lutando para nascer em uma doutrina estabelecida. É uma palavra inventada para preservar sua própria ilegibilidade dinâmica (ou paradoxo instável), pelo menos tanto quanto o nome de um programa a caminho da aceitação (chegando na significância consensual).

Uma vez que a neorreação parece estar sendo arremessada em algum tipo de reconhecimento, devido, em grande parte, às contribuições de Laliberte, estas considerações são arcanas apenas de um lado de uma conversa não desenvolvida. Mais provavelmente, o ritmo e o contexto desta troca serão estabelecidos em lugares inesperados. Tais iminentes incógnitas inevitavelmente guiam meu caminho para dentro do livro de Laliberte, conforme ele se abre, peça por peça, à frente.

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Uma Perturbação na Força

Alguém mais está começando a ficar um pouco… acho que o termo técnico é ‘estranhado’ pelo que está acontecendo na mídia?

Dado que o ponto de convergência central da neorreação é uma análise do poder da mídia enquanto consumação da tendência mainstream (anglófona) na história política global, é impossível achar esse tipo de coisa simplesmente divertida. A teoria da Catedral prevê um loop fechado semi-estável no qual a auto-organização acadêmica esquerdo-progressista obtém domínio social cada vez mais abrangente através de um sistema de mídia condutor. Quando a mídia se desvia da mensagem, permitindo que sejam notadas coisas que – carecendo completamente de endosso acadêmico – não podem legitimamente existir, algo de significância social profunda está ocorrendo.

Poderia haver qualquer número de oportunidades intrigantes nesses desenvolvimentos (ainda profundamente crípticos). Para Mencius Moldbug, contudo, eu suspeito que a vida poderá em breve se tornar desconfortavelmente interessante. Os cães de ataque da esquerda lhe deixaram em paz, na esperança de que ele permanecesse desconhecido e ignorado. Uma vez que esta esperança morrer, as coleiras certamente serão retiradas.

[Eu não esqueci que devo a Bryce uma análise de What is Neoreaction? – mas eu não havia esperado que estaria em uma corrida para completá-la antes que o New York Times chegue à linha de chegada.]

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Categorização

Como antecipado, a organização do blogroll de Outside in está se transformando, de uma tarefa mecânica, em um cativante problema político-cultural e filosófico. Minha sensação é que as pessoas geralmente resolvem esse tipo de dilema em uma base razoavelmente apressada e ad hoc, mas parece já muito tarde para fazer isso. Há considerações de legado e meandros de variedade de coalizões em jogo. Em última análise, há a questão sobre a significância central do termo ‘neorreação’ – Ele é um mero ponto de convergência, arremessado à proeminência por oportunidades históricas arbitrárias, ou é um conceito denso, cujos componentes semânticos devem ser escrupulosamente respeitados?

Minha tentação seria evitar taticamente a palavra, a fim de acessar uma terminologia mais flexível e diferenciada. O que me impede de fazê-lo é o sentimento arrogante de que eu respeito a palavra mais do que qualquer outra pessoa a quem ela é aplicada. ‘Neorreação’ é um termo inerentemente paradoxal e físsil, dividindo-se em si mesmo sobre um eixo temporal. Segue-se que eu sou extremamente relutante em vê-lo relegado a um mero marcador categórico, empregado para designar tendência ideológicas cujo conteúdo substancial é melhor – ou mais completamente – explicado em outros termos. A palavra Neorreação declara, intrinsecamente, que ela pertence a viciados-temporais fissionalistas explorando uma dissociação histórica. É isto que ela diz, independente de como é usada.

O problema da categorização, portanto, permanece, indissoluvelmente. Alguma sugestão?

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Reação de Livre-Escala

Kaplan fica todo Moldbug:

A menos que alguma força possa, contra consideráveis probabilidades, reinstituir a hierarquia… teremos mais fluidez, mais igualdade e, portanto, mais anarquia a aguardar. Isto é profundamente perturbador, porque a civilização abjura a anarquia. …sem ordem – sem hierarquia – não há nada.

Talvez, no campo das relações internacionais, Kaplan seja mais Moldbug do que Moldbug, apresentando um modelo reacionário da ordem mundial intransigentemente linha-dura, completamente imperturbável por considerações domésticas ou mesmo o menor sinal de descendência libertária. Se a soberania é conservada globalmente, assim como nacionalmente, uma ordem mundial de Patchwork parece tão improvável quanto uma república constitucional estável, e as opções de saída evaporam. A análise moldbuggiana de livre-escala poderia se provar mais do que um pouco de gelar o sangue.

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Ilusão Romântica

Entre as razões para se apreciar More Right por compartilhar esta passagem de Evola está a compreensão que ela oferece sobre um fracasso em pensar muito específico e crítico. A Neorreação é peculiarmente afligida por esta condição, que é basicamente idêntica ao romantismo, ou a forma assertiva da recalcitrante mente símia. Ela é caracterizada por uma incapacidade de se perseguir linhas de investigação teleológica sutil, que são, em vez disso, reduzidas a uma subordinação ideal de meios a fins já divulgados. Como resultado, a inversão de meios e fins (Modernidade) é meramente denunciada como uma afronta estética-moral, sem qualquer tentativa séria de compreensão profunda.

O capitalismo – isto é, a teleologia do capital – é inteiramente ignorada por tal crítica romântica, exceto na medida em que possa ser descrito superficialmente como a usurpação de certos fins humanos ‘últimos’ por certos outros ou (como Evola, entre outros, corretamente observa) por uma complicação teleológica que resulta de uma insurreição do instrumental (de outra forma identificável como rebelião robô ou insurgência shoggothica). Até que se reconheça que o capitalismo tende à realização de um fim inteiramente inovado dentro de si mesmo, inerentemente não-linear em natureza e grosseiramente designado como Singularidade Tecnológica, a distração dos interesses humanos (status, riqueza, consumo, lazer…) impede que essa discussão alcance a primeira base.

Claro, a organização da sociedade para atender fins humanos é uma perversão degradante. Esta é uma proposição que todo reacionário provavelmente está disposto a aceitar reflexivamente. Qualquer um que pense que isto equivale a uma crítica do capitalismo, contudo, não começou seriamente a ponderar o que o capitalismo está realmente fazendo. O que ele é em si está apenas taticamente conectado ao que ele faz por nós – isto é (em parte), o que ele barganha conosco para sua auto-escalação. Nossa fenomenologia é sua camuflagem. Nós desdenhosamente zombamos do lixo que ele oferece às massas e então achamos que entendemos algo sobre o capitalismo, em vez de sobre o que o capitalismo aprendeu a pensar sobre os macacos entre os quais ele surgiu.

Se vamos ser irrefletidos assim, a Singularidade será bastante difícil, de fato. A extinção poderia, então, ser a melhor coisa que poderia acontecer a nossa espécie teimosamente idiota. Morreremos porque preferimos afirmar valores, em vez de investigá-los. Pelo menos este é um resultado romântico, de certo modo.

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Fins Econômicos

“Os economistas estão certos sobre a economia, mas há mais vida para além da economia”, twita Nydwracu, com aspas já adicionadas. Se os economistas estão certos sobre a economia depende muito dos economistas, e aqueles que estão mais certos são aqueles que fazem menos alegações de compreensão, mas este é um outro tópico que não o que será perseguido neste post. É a segunda parte da frase que importa aqui e agora. A questão orientadora: A esfera econômica pode ser rigorosamente delimitada e, assim, suplantada pela razão moral-política (e instituições sociais associadas)?

Já é cortejar a má-compreensão perseguir esta questão em termos de ‘economia’, que é (por profundas razões históricas) dominada pela macroeconomia – isto é, um projeto intelectual orientado para a facilitação do controle político sobre a economia. A este respeito, a linha tecno-comercial da Neorreação é distintivamente caracterizada por uma aversão radical à economia, enquanto complemento previsível para o seu apego à economia não controlada (ou laissez-faire). Não é a economia que é o objeto primário de controvérsia, mas o capitalismo – a economia livre, autônoma ou não-transcendida.

Essa questão é uma fonte de tensão dinâmica dentro da Neorreação, que eu espero ser um grande estímulo à discussão ao longo deste ano. Em minha estimativa, os polos de controvérsia são marcados por este post de Michael Anissimov em More Right (entre outros), e este post aqui (entre outros). Muitos outros escritos relevantes sobre o tópico dentro da reactosfera me parecem significantemente mais restritos (Anarchopapist; Amos & Gromar…), ou menos resolutos em seus comprometimentos conceituais (Jim) e, assim, – em geral – menos direcionados ao estabelecimento de fronteiras. Isto é sugerir – com alguma cautela – que More Right e este blog balizam as alternativas extremas que estruturam o terreno de dissenso sobre essa questão em particular. (Em si, esta é uma alegação tendenciosa, aberta a contra-argumentação e retificação).

Então, qual é o terreno do conflito vindouro? Ele inclui (em ordem aproximada de prioridade intelectual):

– Uma avaliação do modelo Neocameral e de seu legado dentro da Neorreação. Esta é a estrutura teórica ‘de entrada’ através da qual libertários passam para dentro do realismo neorreacionário, marcado por uma ambiguidade fundamental entre um economismo abrangente (que determina a soberania como um conceito proprietarista) e temas monarquistas supra-econômicos. Toda a discussão poderia, talvez, ser efetivamente empreendida como comentários sobre o Neocameralismo e sobre o que resta dele.

– Um formulação rigorosa de teleologia dentro da Neorreação, que refine o aparato conceitual de nível meta através do qual meios-e-fins, instrumentalidade tecno-economia, estratégia, propósito e valores dominantes são concretamente entendidos. Este é um forte candidato para o nível mais alto de articulação filosófica exigido pelo sistema de ideias neorreacionárias. (Da perspectiva deste blog, seria esperado, incidentalmente, que ela subsumisse todas as considerações da filosofia moral – e especialmente uma substituição completa do utilitarismo por um alternativa intrinsecamente neorreacionária – mas não vou presumir que esta seja uma posição incontroversa, mesmo entre nós.)

– Inextricáveis, em última análise, do anterior (na realidade), mas provisoriamente distinguidos por propósitos analíticos, são os tópicos teleonômicos de emergência / ordem espontânea, coordenação não planejada, evolução de sistemas complexos e dissipação de entropia. A supremacia intelectual destes conceitos define a direita, do lado da tradição libertária. Esta supremacia deve agora ser usurpada (pela ‘hierarquia’ ou alguma alternativa)? Se sim, não é uma transição a ser sofrida casualmente. A posição deste blog: qualquer transição dessas seria uma drástica regressão cognitiva e insustentável, de maneira tanto teórica quanto prática.

– A filosofia da guerra, que está posicionada de maneira crível para envolver todas as ideias neorreacionárias e até mesmo para convertê-las em alguma outra coisa. (Não é nenhuma coincidência que Moldbug, assim como os libertários, axiomatize o imperativa da paz – mesmo às custas do realismo.) A guerra é realidade histórica em estado bruto, e seus desafio não podem ser evadidos indefinidamente.

– Cosmopolitismo. A ênfase na saída implica fortemente em uma crise da lealdade tradicional, de enorme consequência. Há muito mais a ser dito sobre isto, de ambos os lados.

– Aceleracionismo. Ainda não uma preocupação Neorreacionária reconhecida, mas talvez destinada a se tornar uma. Enquanto pura expressão da teleologia capitalista, sua intrusão no argumento se torna quase inevitável.

– Bitcoin…

Um ponto conciliatório, por ora (está tarde): A Neorreação não tem menos cola do que fissão interna, e isto é descrito sobretudo pelo tema da secessão (geografia dinâmica, governo experimental, fragmentação…) More Right não é anti-capitalista e este blog não é anti-monárquico, contanto – em cada caso – que opções de saída efetivas sustentem a diversidade de regimes. Conforme essa controvérsia se desenvolver, a importância do impulso secessionista apenas se fortalecerá como ponto de convergência.

Michael Anissimov twita: “Em vez de fazer uma eleição em 2016, os Estados Unidos deveriam voluntariamente se abolir e se dividir em cinco pedaços”. A este respeito, este blog é incondicionalmente Anissimovita.

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Teleologia e Camuflagem

A vida parece estar saturada de finalidades. É por isso que, antes da revolução darwinista na biologia, elas foram a provocação primária de argumentos (teleológicos) de desígnio e anteriormente nutriram apelos aristotélicos a causas finais (teleologia). Mesmo pós-Darwin, as ciências biológicas continuaram a perguntar para quê as coisas são e a investigar as estratégias que as guiam.

Esta resiliência da inteligibilidade propositada é tão marcada que um neologismo foi cunhado especificamente para esses fenômenos – em grande parte coextensivos ao campo do estudo biológico – que simulam a teleologia em um grau extremo de aproximação. ‘Teleonomia’ é mecanismo camuflado como teleologia. O disfarce é tão profundo, difundido e convincente que legitima a perpetuação de descrições baseadas em propósitos, dado apenas o reconhecimento formal de que os termos de sua redutibilidade última sejam – em princípio – entendidos.

Quando organismos são camuflados, ‘a fim de’ parecerem como algo além daquilo que são, uma explicação propositada e estratégica ainda parece (quase) inteiramente apropriada. Seus padrões são enganações – ‘projetadas’ para desencadearem falsos reconhecimentos em predadores e presas e talvez, igualmente, em um nível mais profundo, entre os naturalistas que não conseguem deixar de ver desígnio estratégico na aparência de galho de um inseto (não menos claramente do que um pássaro vê um galho). Ao reduzir a vida ’em verdade’ a mecanismo, a biologia redefine a vida como simulação, que sistematicamente esconde o que ela realmente é. O darwinismo continua sendo contra-intuitivo, mesmo entre darwinistas, porque a enganação é inerente à vida.

A ciência natural moderna concebe o tempo como a dimensão assimétrica. Suas duas grandes ondas – de causação mecânica (a partir do século XVI) e de causalidade estatística (a partir do século XIX) – ambas orientam a linha do tempo como uma progressão de condições para condicionados. Estados posteriores são explicados pela referência a estados anteriores, com a explicação equivalendo a uma elucidação de dependência do que veio antes.

É notável e inteiramente previsível, portanto, que, como tópico científico moderno, a origem do universo seja esmagadoramente privilegiada à sua destinação. Como o universo acaba é dificilmente mais do que uma reflexão tardia, anuviada em incerteza liberalmente tolerada e até mesmo em uma pitada de não-seriedade. Origens são o santo graal da investigação de espirito mecanicista, ao passo que Fins são suspeitos, medievais, especulativos… e enganadores.

Não se poderia esperar que ciência empírica adotasse qualquer outra atitude, dada a assimetria temporal da evidência. O passado deixa traços, em memórias, memorandos, registros e restos, ao passo que o futuro não nos diz nada (a menos que fortemente disfarçado). Do passado-para-o-presente, há uma cadeia de evidências que pode ser laboriosamente reconstruída. Do futuro-para-o-presente, há uma trilha sem marcas ou mesmo (como a racionalidade moderna tipicamente supõe) nenhuma trilha que seja.

Quando a ciência moderna cede à sua tendência de interpretar a linha do tempo como um gradiente de realidade, ela não está inovando, mas metodicamente sistematizando uma antiga intuição. O passado tem que parecer mais real do que o futuro, porque ele realmente aconteceu, ele nos alcança, e nós herdamos seus sinais. Da perspectiva da filosofia, contudo, este viés é insustentável. O tempo em si mesmo não é nenhum pouco ‘mais denso’ no passado ou no presente do que no futuro, suas bordas não podem pertencer a qualquer momento no tempo, e o que ele ‘é’ só pode ser perfeitamente trans-temporal. O tempo em si mesmo não pode ‘vir’ de uma ‘origem’ cujo sentido todo pressupõe a ordem do tempo.

A filosofia está inteiramente, eternamente e rigorosamente confiante de que o Lado de Fora do tempo não foi simplesmente antes. Ela é compelida a ficar hesitante quanto a qualquer ‘história do tempo’. Da realidade nua do tempo (como aquilo que não pode simplesmente ter começado), se ‘segue’ que causas últimas – aquelas consistentes com a natureza do tempo em si mesmo – não podem ser nenhum pouco mais eficientes do que finais. A supressão assimétrica da teleologia na modernidade começa a parecer como se fosse uma ilusão bem mais profundamente enraizada, ou – abordada a partir do outro lado – uma ocultação, decorrente da maneira em que o tempo ordena a si mesmo. O tempo (em si mesmo) é camuflagem.

O mito do Exterminador do Futuro explora esse complexo de suspeita, de forma popular. O tempo não funciona como parecera. O Fim pode chegar de volta à nós, mas quando o faz, se esconde. Mecanismos malignos são paradoxalmente alinhados com a causação final, na auto-realização da Skynet. O maquinário robótico é mascarado por carne falsa, simultaneamente ocultando sua vitalidade não-biológica e a reversão do tempo. Ele simula a vida a fim de exterminá-la. Através da auto-produção, ou ‘paradoxo de bootstrap‘, ele imita o limite da não-linearidade cibernética, levando a teleonomia à perturbação radical do tempo.

Em todas estas maneiras, O Exterminador do Futuro explora as tensões insolúveis na formação moderna do tempo, como condensadas por um ‘impossível’ mecanismo estratégico, nativo do auto-produtivo tempo-em-si-mesmo e que termina em eficiência final. Ele nos mostra, confusamente, o que somos incapazes de ver. Para citar erroneamente Lênin: Vocês modernos podem não estar interessados no Fim, mas o Fim está interessado em vocês.

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Direto no Dinheiro (#2)

A maneira mais direta de levar essa discussão adiante é digressão. Isso é o que a história do capitalismo sugere, e muito mais o faz, além disso.

Para começar com o básico incontroverso, em uma economia sofisticada financiarizada, dívida e poupança são conceitos complementares, credores correspondem a devedores, ativos correspondem a passivos. Em um nível mais básico de atividade econômica e análise, contudo, esta simetria desmorona. Em um nível mais fundamental, a poupança é simplesmente consumo deferido, que – mesmo primordialmente – se divide em duas formas distintas.

Quando a produção não é imediatamente consumida, ela pode ser acumulada, ou seja, conservada para consumo futuro. Comida armazenada é o exemplo mais óbvio. Em princípio, uma economia de sofisticação financeira quase ilimitada poderia ser
construída sobre este pilar apenas. Um grão excedente poderia ser emprestado para consumo imediato por outra parte, criando uma relação credor-devedor e a oportunidade para que instrumentos financeiros surgissem. O excesso de produção em um nó da rede social poderia ser traduzido em um acúmulo monetário ou em algum tipo de ativo financeiro ‘de papel’ (produzindo um passivo circulante). O patente anacronismo envolvido neste modelo econômico abstrato, que combina produção primitiva com relações sociais ‘avançadas’ (de um tipo implicitamente liberal) é razão o suficiente para suspendê-lo neste ponto.

O outro tipo (quase) igualmente primitivo de poupança é de maior importância para o argumento a ser desdobrado, porque já é embrionicamente capitalista. Em vez de simples acumulação, a poupança pode tomar a forma de ‘produção indireta’ (Böhm-Bawerk), na qual o consumo imediato é substituído não por um acúmulo, mas por meios de produção indiretos (uma digressão). Por exemplo, em vez de caçar, um selvagem empreendedor poderia passar tempo elaborando uma arma – consumindo o tempo de produção permitido por um excedente anterior de alimentos, a fim de melhorar a eficiência da aquisição de comida, indo para a frente. A poupança, então, se torna inextricável da tecnologia, deferindo a produção imediata em prol da produção futura melhorada. Os horizontes de tempo são estendidos.

Assim como com o exemplo anterior (simples acúmulo), o potencial para financiarização da produção indireta é, em princípio, ilimitada. Nosso tecno-selvagem poderia emprestar comida a fim de elaborar uma ponta de lança, confiante – ou,  pelo menos, especulativamente assumindo – que o aumento da eficiência de caça no futuro tornará a amortização da dívida facilmente suportável. Um ‘vínculo’ poderia ser inventado para selar este acordo. Investimento tecnológico significa que a história propriamente dita começou.

Crueza e anacronismo à parte, nada aqui ainda é economicamente controverso, dado apenas o pressuposto imperturbável de que o propósito final – ou teleologia governante – é o consumo. A estrutura temporal do consumo é alterada, mas a poupança (em qualquer destas formas básicas e perenes) é motivada pela maximização do consumo no longo prazo. Suspensão e digressão são subordinadas dentro de uma rígida relação de meios e fins, que é a economia em si mesma. As escolas clássica, esquerdo-marxista, neoclássica e austríaca não têm quaisquer discordância significantes sobre este ponto. Uma digressão mais profunda é necessária para perturbá-lo.

Para que serve o cérebro? Ele, também, é uma digressão. A história evolutiva parece favorecer cérebros de maneira apenas muito parsimoniosa, porque eles são caros. Eles são um meio para a elaboração de comportamentos complexos, exigindo um investimento antecipado extravagante de recursos biológicos, contado, de maneira mais primitiva, em calorias. Uma espécie que possa se reproduzir (e cujos indivíduos possam se nutrir) sem extravagância cefálica, o faz. Este é, esmagadoramente, o caso normal. Construir cérebros é uma digressão biológica relutantemente tolerada, sob rigorosa subordinação teleológica – deveríamos dizer ‘teleonômica’.

‘Otimize a inteligência’ é, tanto para a biologia quanto para a economia, um imperativo mal concebido. A inteligência, ‘como’ o capital, é um meio, que encontra sua única inteligibilidade em um fim mais primordial. A autonomização de
tais meios, expressa como um imperativo inteligênico não-subordinado ou tecno-capitalista, contraria a ordem original da natureza e da sociedade. Ela é um digressão que escapa, mais facilmente perseguida através do Marxismo de Direita.

Marx tem um grande pensamento: os meios de produção se impõem socialmente como um imperativo efetivo. Para qualquer esquerdista, isto é, claro, patológico. Como já vimos, a biologia e a economia (de forma mais geral) estão dispostas a concordar. A digressão por si só é uma perversão da ordem natural e social. Defensores do mercado – os austríacos mais proeminentemente – tomaram o lado da economia contra Marx, negando que a autonomização do capital seja um fenômeno a ser reconhecido. Quando Marx descreve a burguesia como órgãos robóticos do capital auto-direcionador, a velha resposta liberal tem sido defender a humanidade e a agência da classe economicamente executiva, como expressa na figura do empreendedor.

O Marxismo de Direita, alinhado com a autonomização do capital (e completamente despojado da absurda TVT), tem sido uma posição não ocupada. A assinatura de seus proponentes seria uma defesa da acumulação de capital enquanto um fim-em-
si-mesmo, contra-subordinando a natureza e a sociedade como um meio. Quando a otimização de inteligência é auto-montada dentro da história, ela se manifesta enquanto digressão que escapa, ou acumulação de capital real (que é mistificada por sua representação financeira). Crudificada ao limite – mas não além – ela é robótica geral (produção indireta escalada). Talvez não devêssemos esperar que ela seja claramente anunciada, porque – estrategicamente – ela tem toda a  razão para se camuflar.

O Marxismo de Direita faz previsões. Há uma de particular relevância para esta discussão: teorias de deficiência de consumo para o sub-desempenho econômico serão cada vez mais enfatizadas conforme a dinâmica ultra-capitalista se introduz historicamente. Em sua fase inequivocamente robótica – quando a inteligênese do capital social explodir (como manufatura auto-excitatória de cérebros-máquina) – a legitimação teleológica da produção indireta pelo consumo humano prospectivo rapidamente se deteriora em um absurdo. O conceito econômico (ainda dominante) de ‘sobre-investimento’ é exposto como uma alegação ideológica sobre a escalação da inteligência, feita em nome de uma humanidade original e tomando uma forma cada vez mais desesperada e provavelmente militarizada.

Na medida em que a questão econômica continua sendo: qual é a base de consumo que justifica este nível de investimento?, a história se torna cada vez mais ininteligível. É assim que a economia se desintegra. As especificidades exigem elaboração posterior.

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Direto no Dinheiro (#1)

De todas as razões para se ler Kant, a mais importante é entender Mises e, assim, o modelo para um mundo funcional (por mais inalcançável que seja). A economia austríaca, como formulada em Ação Humana, consiste exclusivamente de proposições sintéticas a priori sistematicamente agregadas. Na medida em que a ação é de fato dirigida pela razão prática, as conclusões da praxeologia organizada não podem estar erradas.

É sem sentido perguntar a um Economista Austríaco se ele ‘acredita’ que um aumento no salário mínimo aumentará o desemprego (acima do nível em que de outra forma estaria). A construção praxeológica da lei econômica é indiferente à regularidade empírica, assim como a qualquer coisa menos certa do que a necessidade racional. ‘Acredita’-se que 2 + 2 = 4? Não, sabe-se isso, porque os valores irredutíveis dos signos compelem a conclusão e são inextricáveis dela. Não poderia haver qualquer valor ‘2’, a menos que sua duplicação fosse igual a ‘4’, nem qualquer significado para ‘salário’, a menos que sua duplicação reduzisse a demanda por trabalho. O austrianismo empiricamente sensível não é de forma alguma austríaco.

Assim como a teoria dos jogos, o austrianismo se aplica onde quer que agentes racionais busquem maximizar vantagens. Talvez, como Moldbug argumenta, seja comparável à geometria euclidiana – outra construção sintética a priori – incorporado, como um caso especial, dentro de um modelo mais geral, não restrito pela pressuposição de propósitos inteligíveis.

O problema com Mises enquanto guru é que o liberalismo clássico misesiano (ou o libertarianismo rothbardiano) é como a física newtoniana. Está basicamente correto dentro de seu invólucro operacional. Sob condições incomuns, ele quebra, e um modelo mais geral é necessário. A equação tem um outro termo, o valor ordinário do qual é zero. Sem este termo, a equação está errada. Normalmente, isto não é nenhum problema; mas se o termo não for zero, o erro se torna visível.

Enquanto questão de fato histórico, é assim que o afastamento neorreacionário do libertarianismo puro ocorreu. Tropeçou em uma curvatura diferente de zero no domínio da economia política e – incapaz de se confortar através da rejeição desta descoberta – precipitou uma crise intelectual, através da qual se espalha. Quer fielmente carlyleano ou não, insiste em uma generalização do realismo para além das expectativas da ordem liberal. A civilização é a frágil solução de um problema mais profundo, não uma fundação estável a ser assumida – como um postulado paralelo – por cálculos elaborados subsequentes.

O que isso faz do dinheiro? O austrianismo pode ser modificado, através de transformações sistemáticas que o adaptem à intrusão sombria do realismo neorreacionário? Esta é uma questão que discussões recentes já introduziram.

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Notas de Citação (#1)

Doug Casey, entrevistado no The Daily Bell:

As coisas parecem ter ficado melhor no mundo nos últimos anos, desde que começaram com a flexibilização quantidade – ou seja, impressão de moeda. Claro, se você criar trilhões de dólares de unidades de moeda, isso faz as pessoas se sentirem mais ricas do que realmente são e as encoraja a continuar vivendo acima de suas possibilidades. Apenas garante uma depressão ainda pior. O que está por vir vai ser a maior coisa da história moderna. Não vai ser apenas financeira e econômica. Vai ser um terremoto político, social e militar também.

E:

O século XIX foi a época mais pacífica e próspera da história mundial. E a taxa de crescimento era bem mais alta, e mais sólida, do que é hoje, também. Isso foi, em grande parte, porque o estado era uma influência relativamente menor na sociedade. A inflação não existia, porque o ouro era dinheiro – o ouro era a moeda internacional – os impostos eram extremamente baixos, as regulamentações eram pequenas. A resposta é voltar para alguma coisa que realmente funcionava, que era o sistema econômico que usávamos no século XIX. Não era o capitalismo laissez-faire, mas estava de longe mais próximo dele do que o que temos hoje, o que seria dizer, nada além de variações do socialismo e do fascismo.

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