Apenas alguns meses atrás, eu nunca tinha ouvido falar da Lei de Poe. Agora é raro um dia no qual ela não brota diversas vezes. Invocações do Zeitgeist são inerentemente improváveis, mas se houvesse uma ilustração persuasiva do fenômeno, seria algo como isso.
De acordo com a entrada sucinta da Wikipédia (já postada), a Lei de Poe tem menos de uma década de idade. Entre seus precursores, também relativamente recentes, um comentário de 2001 na Usenet de Alan Morgan a antecipa de forma mais estreita: “Qualquer troll suficientemente avançado é indistinguível de um maluco”. Em outras palavras, entre uma posição intelectual sincera e sua satirização, nenhuma distinção segura pode ser feita. (Não há nada sobre esta tese que a restrinja à opinião ‘extrema’, embora seja assim que ela é normalmente entendida.)
A última oportunidade para levantar este tópico é, claro, o @Salondotcom. (Há uma divertida entrevista com os trapalhões por trás disso aqui.) A infração desta conta, que a levou a ser suspensa pelo Twitter semana passada, estava clara para além de qualquer dúvida razoável. Bastante simplesmente, ela era quase indistinguível da original, um fato que foi em si explicitamente observado (e tweetado) inúmeras vezes. As paródias das chamadas do Salon, tão ridiculamente exageradas que faziam os leitores do @Salondotcom rir descontroladamente, eram engraçadas precisamente porque eram imitações tão plausíveis das do próprio Salon. O leitores estavam rindo, através do @Salondotcom, do /Salon/. É quase certamente por isto que a conta foi suspensa.
Sem vagar muito profundamente no reino da especulação, vale a pena notar isto:
“As políticas do Twitter exigem que notificações de persofinicação venham do indivíduo sendo personificado” … hmm
A Lei de Poe é, em última análise, indistinguível de um outro conceito retórico recente e que se popularizou rapidamente: o Teste de Turing Ideológico. Pode-se dizer que uma crítica intelectual entende seu adversário se ela for capaz de reproduzi-lo com uma fidelidade adequada. O TTI é, portanto, um procedimento cultural para peneirar argumentos espantalhosos e outras má representações. Se você não consegue imitar o caso do inimigo, não se pode considerar que você se ocupou seriamente dele.
Evidentemente, a Lei de Poe pode ser interpretada como um filtro do mesmo tipo. A sátira é efetiva na exata medida em que ela pode ser confundida com o satirizado. (Isto pode ser levado em direções comparativamente sérias.)
O que a Lei de Poe nos diz é que o antagonismo é irredutível à argumentação. Desta forma, ele é inerentemente anti-dialético (e, assim, tacitamente secessionista). Pode haver um perfeito entendimento do que o inimigo está dizendo, sem sequer o menor grau de aproximação de um consenso. Em outras palavras, existem discrepâncias inteiramente indissolúveis na discussão.
Uma sátira cortante não reconstrói uma posição cognitiva a fim de torná-la risível. Em vez disso, ela re-expõe tal posição, tão fielmente quanto possível, dentro do registro da risada – isto é, da hostilidade. Ela afirma um dissenso que nenhum processo de reconciliação pode melhorar. Nossa ‘discordância’ não é o sinal de uma conversa ausente. É o chamado de uma cisão por vir.
Original.